A narrativa deste filme acontece em Maio de 1968 em Paris,
palco de inúmeras revoluções e manifestações que apelavam a uma renovação dos
valores culturais conservadores, que explode em Maio de 68 com uma greve geral
na França que mobiliza aproximadamente dois terços dos trabalhadores franceses.
Considerada por alguns pensadores e filósofos, como uma das mais importantes
revoluções do século XX, ela viria abanar a sociedade francesa com novos
valores de cultura, educação, sexualidade e prazer.
Os Sonhadores (The Dreamers) são um espelho disso mesmo,
jovens que vivem em conflito com o Mundo e si próprios, desprendidos dos
valores morais conservadores e que assistem à revolução a que tanto apelam pela
janela do apartamento onde vivem, se conhecem e apaixonam. Um filme que surge
entre a realidade de uma época, e consequentemente um reflexo da mesma, e uma
narrativa controversamente apaixonante baseada no livro de Gilbert Adair, “Os
Sonhadores”.
Bernardo Bertolucci trás até nós três personagens Matthew
(Michael Pitt) um jovem norte-americano que se encontra em Paris para aprender Francês,
Theo (Louis Garrel) e Isabelle (Eva Green) o irmão gémeos, que conhecem Matthew
e que partilham entre si uma paixão enorme pelo Cinema Clássico. Assim este
filme tão polémico quanto genial, encontra-se numa dictomia sobre o amor
ingénuo mas genuíno carregado de sensualidade e sexualidade, a inversão de
valores morais, falando do incesto como algo quase afável e mais poético do que
carnal, uma intensa cinefilia nas inúmeras referências que faz a Clássico do
Cinema, como se de um poema de amor ao próprio Cinema se tratasse.
A história narrada ao som de Joplin, Doors, Dylan, Hendrix,
entre outros ícones musicais da época, conta como os três jovens se conhecem e
envolvem num romance apaixonante, tórrido e intenso. Tudo começa quando Matthew
conhece os irmãos numa das inúmeras manifestações que ocorrem à porta da Cinémathèque
Française, depois do despedimento do fundador e director da casa, Henri
Langlois. Matthew deixa-se levar pela beleza e sensualidade de Isabelle, e
acaba ‘apaixonado’ pelos dois irmãos. Assim começa a amizade entre os três
jovens, só finalmente consumada quando os três batem o record dos personagens
do filme de Jean-Luc Godard, “Bande à part” (1964). Matthew, Theo e Isabelle
passam as tardes a discutir Cinema, cultura, política e comportamento. Constantemente
criam desafios envolvem filmes do Cinema Clássico, e é também nestes jogos que
a sexualidade e a relação a três evoluí. No entanto este filme pretende mais
que chocar pela libertinagem poética com que aborda o sexo e nudez mas sim o ‘amor’
torna-se aqui só mais um elemento da história e não o aspecto dominante da
mesma. Os Sonhadores fala de revolução e fala também da crise das personagens
perante o Mundo em mudança a que assistem. Theo brada contra o sistema, mas é
incapaz de acompanhar as manifestações que acontecem à sua janela. Já Matthew
desafia os irmãos a crescerem e a lutarem, mas ele mesmo prefere o discurso pacifista
ao confronto de verdade. Isabelle, é ao mesmo tempo sensual e erótica,
romântica e misteriosa, mas acima de tudo extremamente envolvente. Para isso
Bertolucci usa não só a banda sonora, que nunca soo tão honesta num outro filme
quanto neste, como faz uso da sua mestria enquanto realizador, de uma
fotografia apaixonante brincando com a luz para criar as sensações dos
ambiente, uma edição perspicaz e as já referidas referências Cinematográficas.
Os Sonhadores não é um filme de intensa reflexão, é directo
e claro. Tão visualmente explicito que não nos dá espaço para isso. Mas o filme
apela acima de tudo ao Cinema, ele próprio, como arma de transformação.