A construção do básico
Recentemente, Joana Vasconcelos criou, a convite da casa Dior, um novo trabalho que tem tido um sucesso crescente. Trata-se de um laço gigante, dourado, chamado "J'adore Miss Dior". "J'adore" por causa dos frascos que decoram a escultura, e "Miss Dior" porque a forma do laço lembra-nos o icónico perfume.E é isto. Penso que não se podia ter encontrado explicação mais óbvia, como um simples jogo de palavras ou de associação.
Como é que algo tão básico tem tanto êxito?
Isto deve-se à mentalidade actual influenciada por vários conceitos trazidos pela massificação.
Jean Baudrillard na sua obra "A Sociedade de Consumo" afirma que " Encontramo-nos em pleno foco do consumo enquanto organização total da vida quotidiana, enquanto homogeneização integral onde tudo está compendiado(...) O trabalho, o lazer, a natureza, a cultura (...) ei-las agora como um todo misturado (...) homogeneizado no mesmo "travelling" de um "shopping" (...) Finalmente, eis tudo digerido e restituído à mesma matéria fecal homogénea" devido ás vidas que levamos, ao nosso trabalho, ao facto de estarmos submetidos a todo o tipo de horários, criámos um dia-a-dia com ritmos muito acelerados e a partir daqui começámos a cultivar um gosto e uma necessidade por tudo aquilo que é óbvio, simples e básico.
Já não há espaço para a contemplação ou para a meditação. Roland Barthes analisou e estabeleceu comparações no livro "O grão da voz", baseando-se nas suas vivências no Japão. Definia os factores da vida japonesa como algo muito mais fluído "as inscrições, os gestos da vida quotidiana, os pequenos ritos da cidade (...) Para mim, tudo aparece aí como os traços, os acidentes de um texto. No Japão, estou numa constante actividade de leitura".
Talvez seja disto que nós precisamos agora: de abrandar, de reflectir ou de estarmos mais atentos, para aprendermos a encontrar, valorizar e estimar um mundo de coisas realmente interessantes.