sábado, 23 de novembro de 2013

Obrigado por fumar

Numa altura em que são conhecidos os perigos do tabaco e as doenças associadas ao seu consumo, de que forma se pode convencer o público a fumar? O filme de 2005, de Jason Reitman, Obrigado por Fumar, relata a vida de Nick Naylor, cujo trabalho consiste em arranjar estratégias para convencer o público americano a fumar, ou seja, como tornar atraentes produtos perigosos. A publicidade entra aqui com um papel fundamental visto que se trata do meio mais viável de chegar ao consumidor. O problema é perceber qual o tipo de publicidade mais adequado, o mais influenciável. Para chegar a uma conclusão é necessário entender os seus mecanismos: a sua eficácia baseia-se na persuasão, apelando aos desejos mais inconscientes do ser humano; em 1910, Le Bon escreve 

Não é de forma nenhuma por serem certas que as ideias se impõem, elas só se impõem quando, pelo duplo mecanismo da repetição e do contágio, invadem as zonas do inconsciente em que se elaboram os modos geradores do nosso comportamento.

O truque está em criar sequências visuais descontínuas, rápidas e incoerentes, semelhantes aos sonhos, ou ainda, associar o produto a um determinado sentimento ou até mesmo a uma personalidade.

Surge então uma ideia: Nick Naylor sugere voltar a incorporar os cigarros nos filmes, sem serem associados a “psicopatas ou europeus”. No fundo é voltar à década de 20, em que era necessário pôr os actores ocupados com alguma coisa enquanto falavam – a fumar. Pegar em grandes ícones da indústria do cinema, como Brad Pitt ou Catherine Zeta-Jones, e pô-los a fumar em cenas-chave dos filmes. A ideia a transmitir é: “fumar é fixe”.

Obrigado por Fumar apresenta-se com um tom humorístico e irónico, não deixando de criticar a sociedade consumista e manipuladora em que vivemos. Torna-se interessante por tratar de um tema tão mediático e polémico, especialmente tendo em conta todas as leis que ultimamente se criaram e todas as campanhas de sensibilização, que têm alertado para os perigos do tabaco.

Torna-se curioso, e na minha opinião relevante, reparar que a sociedade consumista que ainda agora referia, ter sido impulsionada por Edward Bernays, o mesmo senhor que na década de 20 do século passado fez com que deixasse de ser tabu as mulheres fumarem em público. Bernays foi o primeiro a pegar nas ideias de Freud (seu tio) e usá-las para manipular as massas. O objectivo era fazer as pessoas comprar um produto de que não precisam associando-o aos seus desejos inconscientes. Se para a mulher o cigarro representava o poder masculino, era necessário associá-lo ao desafiar do mesmo. Posto isto, Bernays combina com um grupo de jovens debutantes para acenderem dramaticamente um cigarro durante um desfile em plena Nova Iorque. A este simples acto foi associada a frase “tocha da liberdade”, o que se tornou num assunto bastante mediático. Bernays criou então a ideia que se uma mulher fuma, isso a torna mais poderosa e independente, e a partir daí as vendas de tabaco ao público feminino aumentaram significativamente. A ideia de fumar tornar as mulheres mais independentes é completamente irracional, mas o importante é que as faz sentir mais independentes. Tudo gira em volta da questão de como queremos ser vistos.

Apesar de serem épocas diferentes, as técnicas de persuasão continuam as mesmas e o objectivo continua a ser manipular as massas. Respondendo à questão inicial, a meu ver os filmes ainda são o que influencia mais. O facto das personalidades conhecidas fumarem leva mesmo a acreditar, e de certa forma a tornar racional (apesar de não ser), que fumar é mesmo cool. Leva-nos a crer que fumar transmite uma certa imagem de nós próprios, quer seja de independência, que temos um certo estilo ou até mesmo que pertencemos a um certo grupo.