segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

O "objecto" na sociedade

No mundo de hoje deparamo-nos com uma sociedade que se preza muito pelos bens materiais, que consegue julgar a partir de uma cultural material. Isto é, com base na aquisição de bens revela-se o estatuto social a que pertence cada indivíduo. Com esta fome pelos bens materiais revelou-se cada vez mais uma certa falta de criatividade artística como um número menor de objectos que reflictam o seu criador, que contenham o seu toque característico.

Com base nas obras produzidas manualmente pelos artesãos, numa época em que a máquina não se encontrava perto do que é capaz de fazer hoje, era capaz de se notar o cunho pessoal do artesão. Numa altura em que o trabalho reflectia o seu criador, e a quantidade de produção era muito menor, o trabalho demonstrava as influências externas, e era criado em sintonia com a natureza, com o "mundo externo sensível"1.

Numa luta entre a qualidade e a quantidade, a quantidade ganhou. Com a quantidade veio uma futura alienação do produto realizado. Quero com isto afirmar uma desapropriação do produto, onde a criação já não pertence ao criador, e consequentemente, com maior produção, o objecto apodera-se da vida do trabalhador transformando-a numa "força hostil e antagónica"1. O trabalhador, cada vez mais, tem de produzir mais e trabalhar mais de forma a receber os "meios de subsistência", o salário que lhe permite substanciar as condições necessárias para a sua vivência diária.

Com o salário que recebe acaba adquirindo produtos produzidos em massa, quer seja o próprio produto que ajuda a produzir ou outros. Ou seja, de certo modo, trabalhamos para consumir. Todos os dias trocamos o dinheiro que recebemos por diferentes bens, alguns essenciais à nossa sobrevivência, e outros mais materialistas, que se infiltraram já tanto na sociedade que passaram a ser indispensáveis para o nosso dia-a-dia.

Ao criarmos cada vez mais objectos tecnológicos que passam a ser um "must have" da nossa sociedade, começa a existir uma barreira social entre quem os tem, quem não os tem, e os que tem. Por exemplo, existe uma diferença de preços entre os que não são considerados muito bons, e os que já têm um nome mais divulgado e que são considerados melhores, e a partir do modelo exacto que cada indivíduo compra vai poder reflectir o estatuto do mesmo, como a que grupo social pertence.

E é assim que nós cada vez menos possuímos objectos originais e únicos (no sentido em que agora seguem todos um modelo/padrão esquematizado e não têm o cunho pessoal que tornava cada peça única) em prole da quantidade, de diversos produtos de vários sectores. Ao trabalharmos para consequentemente consumir reflectimos o ciclo vicioso já existente há muito, mas com a evolução tornou-se cada vez maior e distribuído por mais sectores que passaram a existir devido à própria evolução.



1  Karl Marx (1993) "O Trabalho Alienado" in Manuscritos Económico Filosóficos