domingo, 29 de dezembro de 2013

Mary and Max and Asperger



Em todos os grupos sociais, existe uma maioria que dita o que é o suposto correcto. Um acumular de tradições, vivências, modas, leis, costumes, aparências. No entanto, há sempre uma grande parte que vive excluída da maioria, que se desvia ao “normal”, seja pela vontade de se destacar, pelas suas atitudes, etc.

Há também quem não escolha ter um comportamento desviante; que sob certas condições ou circunstâncias, age na sua vida de uma forma inconsciente, alheio à preocupação do que será ou não correcto. A pessoa até pode discordar com as regras ditadas pela sociedade, mas por ter um comportamento diferente da maioria das pessoas, por quebrar uma certa regra imposta, acaba por ser quase completamente alienada da sociedade em seu redor. O seu mundo é diferente, mas não percebe porquê.


É essa a temática tratada no filme de 2009 “Mary and Max”. Baseado numa história verídica, o filme trata uma amizade muito única e genuína, embora decorra em circunstâncias um tanto sinistras e invulgares. Mary é uma menina australiana de 8 anos, filha de um pai desaparecido, e de uma mãe alcoólica. Estes dois factos já são motivos suficientes para exercer pressão numa criança, mas Mary é ainda sobrecarregada diariamente com maus tratos por parte de outras crianças. Sendo uma criança singular, leva uma vida destituída de amizade, o que a leva a pegar numa edição de páginas amarelas dos Estados Unidos da América e escolher um nome ao acaso para começar uma troca de correspondência. A pessoa aleatória acaba por ser Max, um quarentão nova-iorquino que sofre de Síndrome de Asperger1. Estas duas personagens peculiares unem-se através dos seus interesses comuns, das suas dúvidas existências (que apesar de ser algo compreensível vindo de uma criança, também estão presentes neste portador de Asperger), da solidão e do ponto de vista inocente sobre a vida que partilham.


Ao longo do filme surgem pequenos episódios de reflectem os problemas que pessoas com este tipo de perturbação se deparam; como terem noções biológicas irrealistas (eg Max achava que as crianças nasciam de ovos colocados por rabbis), não interpretar certas frases para além da sua face literal, ter objectivos de vida diferentes dos demais, e especialmente bem menos significativos (como conseguir fazer um amigo que não fosse invisível e comer chocolate).


Por mais ingénuo que os pensamentos e comportamentos de Max fossem, não eram vistos como apropriados num homem de quarenta anos, e daí ser vítima de alienação por parte da restante comunidade. “Mary and Max” obriga-nos então à reflecção; a questionarmos quem é que aqui é insólito, o estranho - tudo depende do ponto de vista.



1 O Síndrome de Asperger é um transtorno do espectro autista que diferencia da sua condição clássica no facto da fala ser compreensível