A ideologia é um conceito que sempre suscitou um grande
interesse aos filósofos e pensadores de cada época. Ao analisar a teoria de
Louis Althusser (1919/1990) sobre a ideologia, John Fiske (1939) utiliza os
saltos altos, símbolo irrefutável do poder feminino, para exemplificar o poder
que a ideologia exerce sobre a mulher, de uma forma incrivelmente subtil. A seu
ver este objecto, ao acentuar as formas consideradas “atraentes” pela sociedade,
coloca o sexo feminino submetido ao masculino, pois esta seria uma tentativa de
agradar, de obediência ao que é imposto pelo poder superior (que seriam os
homens), exaltado pelo desequilíbrio e dor que pode causar. Assim, a mulher
estaria a reforçar a ideia que o sexo masculino é mais forte, mais poderoso e
por isso superior e que a feminilidade é frágil e passiva.
A verdade é que esta teoria foi escrita por um homem, que
provavelmente nunca calçou uns saltos altos e que não sabe bem o que eles
significam. Pois bem esta é, exatamente, uma teoria e que pode ser contraposta.
O que Fiske não se lembrou de sublinhar é que os saltos altos foram utilizados,
nos seus primórdios, tanto por homens como por mulheres. Um modelo primitivo de
saltos altos figura em murais do antigo Egito, datados de 3500 a.C., e mesmo os
Gregos os utilizavam nas suas peças de teatro para representar diferentes
classes sociais, consoante a sua altura. É a Catarina Médici, casada com
Henrique II de França, que está atribuída a “invenção” deste modelo, mas foi
Luis XIV de França que os tornou verdadeiramente populares, associando-os ao
luxo e ao poder. A verdade é que é isso que o salto alto simboliza: poder.
Uma mulher calça uns sapatos de salto alto e sente logo o
poder que este emana. Sim, exalta os padrões de beleza impostos pela sociedade
ideológica e sim, faz uma grande distinção entre o sexo masculino e o feminino,
mas não pela sua fragilidade. Pelo contrário, os saltos altos enfatizam o poder
que a beleza de uma mulher exerce sobre o homem, a forma como a aparência física
e a beleza consegue levá-lo a submeter-se completamente. A verdade é que a aparente
fragilidade é uma arma secreta da mulher, que os homens, na sua robustez e
deselegância, admiram e procuram.
Apesar de ser uma ferramenta cujo poder vem, irrefutavelmente,
da ideologia, o salto alto não é uma submissão da mulher perante o homem. É uma
forma de autoestima, da exaltação de um poder que só o sexo feminino consegue
controlar.