segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

A contribuição do cinema na manipulação da realidade




        Para Benjamim, na  arte pré-moderna as obras possuíam um caráter aurático  uma vez que procuravam atender aos rituais religiosos .Para o autor , uma obra pré-moderna era  caracterizada como sendo  única, singular e  relacionada com o seu contexto histórico e temporal.
       No entanto,  pensando na  reprodutibilidade técnica da arte na época moderna, parece que contribuiu  de algum modo para  que  a arte perdesse esse caráter de singularidade e de unicidade de outrora. A arte contemporânea, ao longo dos anos ,  desprendeu-se cada vez mais  do conceito tradicional de arte. Este fato, não é visto por Benjamin como algo "nocivo", como tal  defendia  que a obra ficasse mais próxima das massas, como era o desejo dos surrealistas, segundo Benjamin:
Cada dia fica mais irresistível a necessidade de possuir o objeto, de tão perto quanto possível, na imagem, ou antes, na sua cópia, na sua produção (…) Retirar o objeto do seu invólucro, destruir sua aura, é a característica de uma forma de percepção cuja capacidade de captar o “semelhante no mundo” é tão aguda, que graças à reprodução ela consegue captá-lo até no momento único.  (BENJAMIM,1994, p170)
        Deste modo  Benjamim defendia   que  a  reprodutibilidade técnica nega a aura artística e que o próprio significado da  da arte se modifica como também a sua função, deixando  de fundar-se no ritual e passando a ter uma função política, uma vez que passou a   permitiro acesso aos bens culturais a um  maior numéro  de pesoas  e  possibilitou  deste modo a democratização da informação. Benjamin no ensaio" A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica" , análisou com especial atenção o cinema ,observando  algumas vantagens de caráter político na utilização de uma arte baseada  na reprodutibilidade. O autor fez uma comparação entre o papel do cinegrafista com o do pintor. Afirma que o cinegrafista penetra profundamente na realidade comparando com  o cirurgião que  intervém no corpo do paciente, enquanto o pintor mantém certa distância.Ou seja, para ele o cinema  tem maior potencialidades em  desvendara realidade do que a pintura.
     Na minha opinião,  o que fundamenta tamém  esta afirmação e o fato do cinema  ter como "matéria" a própria realidade, enquanto a pintura  tem basicamante,  como matéria a imaginação do artista. Mas também , pensando melhor em relação ao cinema -o filme também pode dedicar-se a manipulação do real.
                      Assim, a descrição cinematográfica da realidade é para o homem moderno infinitamente mais significativa que a pictórica, porque ela lhe oferece o que temos o direito de exigir da arte: um aspecto da realidade livre de qualquer manipulação pelos aparelhos, precisamente graças ao procedimento de penetrar, com os aparelhos, no âmago da realidade.(BENJAMIM,1994, p187)
     Um outra obsevação  do autor a respeito da comparação entre o cinema e a pintura foi: numa exposição ,por exemplo, existe uma separação entre aquele que observa a pintura  e o especialista que faz a crítica da obra, enquanto que no  cinema, segundo Benjamin, isso não acontece devido ao a sua manifestação coletiva onde as as reações dos cinéfilos se autocondicionam, no momento em que  comentam em conjunto  aquela recepção coletiva.  Mas qual sera o potencial crítico do filme em penetrar a realidade?
      A  câmara foi o instrumento que serviu para manifestar o meio social , deste modo o cinema abriu novas possibilidades estéticas e novas  análises da realidade através dos grandes planos, da câmera lenta que  possibilitaram a observação de detalhes e outros ângulos de um modo coletivo que na reaidade nunca se pensava poder ver. O espaço em que o ser humano  agia conscientemente  foi substituído  por outro em que a sua ação é inconsciente.
O gesto de pegar um isqueiro ou uma colher nos é aproximadamente familiar, mas nada sabemos sobre o que se passa verdadeiramente entre a mão e o metal (…) Aqui intervém a câmara com seus inúmeros recursos auxiliares, suas imersões e emersões, suas interrupções e seus isolamentos, suas extensões e sua miniaturizações. Ela nos abre pela primeira vez, a experiência do incosciente ótico, do mesmo modo que a psicanálise nos abre a experiência do inconsciente pulsional. (BENJAMIM,1994 p189).
         O autor  afirma que o cinema  possui  o poder de registrar os estereótipos individuais, realizando um papel semelhante ao realizado pela psicanálise- o filme transforma o espectador num ser que sofre de psicose, alucinações ouna perspetiva de um sonhador. Deste modo , Benjamin conclui que o  filme é capaz até mesmo de representar os estereótipos sociais- por exemplo: um filme de ficção ou de caráter documental, é formado em grande parte por concepções coletivas, que em certo sentido constituem o inconsciente coletivo.O público-massa, sem se aperceber , é “envolvido pelo ritmo de suas vagas” (BENJAMIM, p.191).Ao envolver o público no seu ritmo o filme  coloca-o diante de novas questões as quais  mesmo  distraído consegue responder.
       Penso que o autor tentou perceber e apontar as  caracteristicas de uma nova arte baseada nas  técnicas industiais de produção.  Para ele o instrumento  técnico - a camara -era capaz de devolver ao homem a dimensão mítica e onírica da arte,que sempre existiu na antiguidade.O autor deixa a sensção de que   pretende extrair dessa nova arte que se baseia no sonho e no inconsciente coletivo a libertação do homem em relação aos seus condicionamentos sociais e á opressão do capital .Pois, segundo o raciocínio de Benjamin qualquer proposta revolucionária passa pelo nível do inconsciente- o sonho representa desejos, o “desejo verdadeiro (latente) pode ser quase invisível, em um nível manifesto, e só pode ter acesso a ele através da interpretação do sonho” (BUCK-MORSS, 337)  Deste modo,  coclui-se  segundo o raciocínio de Benjamim, as inovações tecnológicas e estéticas são suficientes para dar origem a uma arte revolucionária.
          Walter Benjamin  demonstrou com a sua análise que os  novos recursos poderiam sim ampliar a expressão artística, originar  novas linguagens e como tal e novas funções  da arte e, atualizando o conceito de arte na contemporaneidade.