sábado, 28 de dezembro de 2013

Já não há paciência

Há pouco tempo li um artigo no "Ípsilon" (o suplemento do jornal "Público") de António Pinto Ribeiro que me deu muito que pensar. Para começar, no texto é feita uma comparação entre os programas de culinária e a "grandeza" e "teatralidade que a culinária e os alimentos realmente merecem". Ou seja, nos concursos de cozinha muitas vezes é nos apresentado um certo frenesim e competitividade que, se pensarmos bem , são desnecessários.
Esta pressa não corresponde às ideias apresentadas no quadro de Josefa de Óbidos, "Uma natureza morta com doces e barros", de 1676 ( que neste caso serve de exemplo). Pretende-se transmitir uma "panóplia de sugestões sensoriais" sugerida "pelos folares pascais ali pintados, pelos ovos cozidos, pela tigela de doce de chila, os pães de ló, as queijadas", realça-se o melhor que há na comida. Aqui os ingredientes correspondentes a cada estação são respeitados. É preciso esperar, isso faz com que o aparecimento de um novo alimento seja um acontecimento especial.
Todos os concursos, desafios ou duelos culinários são o reflexo destes ritmos apressados em que hoje vivemos. Sacrificamos, por isso, a qualidade dos produtos e, de certa forma recusamos a paciência que era pedida por muitas destas técnicas e pelos tempos de cada colheita.
Se estivermos atentos percebemos que a qualidade dos produtos está cada vez mais a diminuir, não só no que toca à comida, mas também em tudo o resto: telemóveis, roupa, música,etc.
Tudo é feito com muita rapidez, não se explora nada de novo, "contraria-se a ideia de haver um momento especial", quase que neutraliza o carácter único que certas coisas tinham.
No fundo estas particularidades são contornadas a favor da publicidade ou do dinheiro rápido.
Portanto, nestes programas "Destituídos de alma parecem antes estimular a bulimia, o consumo imparável" deixa de haver espaço para algo de mais puro.